Vai mal a educação neste país?

Todo mundo se preocupa com a educação neste país, especialmente os meios de comunicação. Mas como se sabe se a educação neste país vai bem ou vai mal?

Uma das maneiras de medir a educação no país é através da sua posição no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que considera, além da renda, educação e saúde. O Brasil ocupa a 85ª. posição neste índice, atrás de países como Chile, Argentina, Urugai e Peru mas ainda na frente do Equador e da Colômbia. E isso é o que é reverberado pela mídia preocupada com a educação neste país. Em algumas reportagens vemos que o Brasil vai bem, obrigada, em termos de IDH, justamente por causa da educação: como até os anos 1990 a educação era incipiente neste país, temos que esperar a população jovem virar adulta para o IDH melhorar. 

O que me causa estranheza nesse resultado não é a posição do Brasil em si, mas é a comparada ao desempenho das universidades brasileiras em outro índice. Pela terceira vez a USP lidera o ranking das 10 melhores universidades da América Latina. E nesse ranking, aparecem outras universidades brasileiras: em 3º. lugar a Unicamp, em 8º. lugar a UFRJ e em 10º. lugar a UFMG. Podemos dizer que as melhores do Brasil aparecem como as melhores da América Latina (cf. http://www1.folha.uol.com.br/educacao/2013/05/1286035-pela-3-vez-usp-lidera-ranking-das-melhores-universidades-da-america-latina.shtml).

Mas os países com melhores posições no IDH não aparecem com as melhores universidades, como é o caso da Argentina, do Peru e do Uruguai. Como se explica uma posição no IDH atrás de países como Argentina, Peru e Uruguai que não aparecem na lista das dez melhores universidades da América Latina? Há um hiato entre o que se faz na universidade e o que se faz fora da universidade? É isso? Ou as universidades que ocupam o ranking das dez melhores da América Latina não estão ali por causa de seus cursos de licenciatura, mas por causa dos cursos de exatas e da saúde? É isso mesmo?  Não é isso mesmo.

Os critérios para definir a colocação de uma universidade são os seguintes: reputação da instituição na academia (30%), reputação da instituição no mercado de trabalho (20%), trabalhos por docente (10%), citações por trabalho (10%), relação professor / aluno (10%), professores com doutorado (10%), impacto na internet (10%). Ou seja, se a universidade tem uma boa reputação na academia e no mercado de trabalho, já tem 50% dos quesitos preenchidos. Os outros 50% são quase todos de responsabilidade dos professores: têm doutorado? produzem? os trabalhos são citados? há impacto na internet? dão aula pra quantos alunos em média?

Até aí tudo bem: a universidade é boa porque tem boa reputação e tem boa reputação porque seu quadro docente é altamente qualificado e produtivo. Então, seus alunos vão ser os melhores também porque têm os melhores professores. É isso o que acontece? É de inteira responsabilidade do professor o profissional que ele está formando? Ou melhor: é de responsabilidade do professor que dá aula para licenciatura a educação ir bem ou mal neste país? É em parte.

É da responsabilidade do professor dar a aula, tirar as dúvidas, explicar a matéria, etc e tal. Mas não é da sua responsabilidade o que o aluno faz com aquela informação. E o que eu tenho observado ultimamente nos cursos de graduação é um comportamento de aluno de segundo grau: perguntam o significado de uma palavra que está no texto (ao invés de ir ao dicionário procurar); passam o tempo todo copiando tudo, exatamente tu-do o que é dito em sala de aula (como taquígrafos); nas respostas da prova, se limitam a reproduzir o que foi dito em sala de aula (revelando que não leram o texto); reclamam que têm que fazer prova em sala e pedem pra fazer em casa. Alguns ainda dizem assim: "não me identifiquei com essa disciplina", ou então "meu lance é literatura, sempre detestei port". Como assim "não me identifiquei" com uma disciplina que é obrigatória? É uma disciplina, não é uma amizade nova! Como assim assim "meu lance é literatura"? Então pra escrever não precisa de língua? Os melhores escritores não são aqueles que brincam com as palavras? Que fazem mágica com as palavras? E não precisa de "port" pra fazer mágica?

Por outro lado, os alunos engajados, que têm comportamento de aluno universitário, ficam discutindo as questões sócio-econômico-político-educacionais da universidade, e se esquecem de assistir aula. De vez em quando, eu vejo esses alunos pedindo a palavra para chamar os colegas para um ato, uma manifestação, uma ocupação para resolver um problema da universidade. Mas não os vejo em sala de aula. Outro dia até brinquei: disse que os alunos do movimento estudantil tinham que se movimentar para a sala de aula, para a biblioteca, para os livros também. Não que o movimento estudantil não seja importante. É importantíssimo, mas não é justificativa para sistematicamente não assistir aula ou não estudar. Mas isso é outro assunto.

O assunto de hoje é "vai mal a educação neste país?". Penso que nem vai tão mal assim, e os índices revelam isso. Mas penso também que parte da excelência dos alunos é de responsabilidade deles mesmos. Não adianta estar numa das melhores universidades da América Latina, tendo atitudes de aluno de ensino médio. Não adianta mesmo.

Comentários

  1. Só faltou vc falar tbm dos professores. Que se esquecem de cativar seus alunos, fazendo os mesmos de palhaços, tratando-os, também, como adolescentes no 2º Grau.
    Esquecem q estão lidando com adultos no mundo real, q tem problemas reais, q ficam doentes, resolvem problemas, trabalham... q vez ou outra n podem ir, mas q n podem contar com a solidariedade d muitos dos professores pq nem atestado médico aceitam: "atestado não abona falta". Que perdem o fds fazendo os trabalhos com total dedicação, q dão prioridade a certa matéria, deixam outras de lado pq tem prova, estudam igual um corno, e chega na hora do resultado, uma nota ridícula... pq o aluno além de estudar tem q ser ninja "ledor" de mentes.
    Não é uma crítica a vc Silvia Cavalcante, afinal nem tive aula com vc.
    É apenas um desabafo!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Eu sei que não é uma crítica a mim. E você tem razão num ponto: não adianta ser professor de uma das melhores universidades da América Latina e tratar os alunos como alunos de 2o. grau; agir como professor de 2o. grau. Isso eu sei que eu não faço.

      Excluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Diário de Quarentena: sete meses depois e eu vou falar do pronome neutro ou a peleja pronome neutro x preço do quilo do arroz

Diário de Quarentena: "O sistema de pronomes neutros e o preconceito linguístico: resposta ao Isaque"

Diário de Quarenta: Um ano depois ...